A importância dos avós e netos em tempo de pandemia

A importância dos avós e netos em tempo de pandemia

Desde o início da pandemia por covid 19, que chegou a Portugal em março de 2020, que se instalou um súbito afastamento entre faixas etárias anteriormente tão próximas: avós e netos. As últimas décadas trouxeram para diversas sociedades um alargamento da esperança média de vida, num modelo social em que os mais velhos não só vivem mais anos como conseguem-no com muito mais qualidade de vida: os avós passaram a ser figuras ainda fisicamente ativas e emocionalmente muito próximas dos netos.

Aliás, a sua presença foi-se afirmando progressivamente de uma forma sempre presente na rotina de muitas crianças, assumindo tarefas que por diversas razões (sobretudo profissionais) os pais não conseguem completar ao longo dos dias: ir buscar à escola os mais novos, ajudar no transporte para actividades extracurriculares, organizar refeições, dar um suporte e uma retaguarda aos fins-de-semana e nos longos e difíceis períodos de férias alargadas. Em muitos casos ainda, e dado o número de disrupções familiares como as separações e os divórcios, a casa dos avós e alguma possibilidade de ajuda financeira da parte destes, foram aspetos absolutamente fundamentais para o precário equilíbrio de alguns núcleos mais frágeis e desprotegidos.

O início da pandemia tornou claro a forma como a idade avançada se constitui num dos principais factores de risco para a infecção por covid e, sobretudo, para o grau de mortalidade atingido: até há pouco tempo atrás, em Portugal a média de idade dos óbitos registados nesta pandemia era de 81 anos. Subitamente, as crianças e os adolescentes tiveram que lidar não apenas com o distanciamento e desvinculação de pessoas que até então estavam afectivamente e fisicamente próximos e eram parte das suas rotinas, como também passaram a ser confrontados com o risco da sua contaminação e eventual perda.

Muitos avós, mesmo avisados dos riscos existentes, ousaram querer prosseguir, respeitando o que por um lado lhes era pedido, mas por outro não abdicando totalmente de verem e estarem próximos daqueles que verdadeiramente são a mais importante luz das suas vidas. Outros, tiveram que reforçar distanciamentos e têm passado por meses e meses de sofrimento emocional subsequente a esta nova pandemia, tal como as crianças e os adolescentes que tiveram que gerir a sua presença apenas através das boas imagens afectivas que já existiam e, com certeza, hão-de voltar a surgir.

Sabemos que o contacto emocional com pessoas significativas modela vários factores do nosso funcionamento geral: por exemplo, aumenta a segregação de certas hormonas e de neurotransmissores considerados responsáveis por sensações de bem-estar e alegria, como a dopamina, a sertalina e ainda a ocitocina, a agora designada hormona do amor. Também alguns estados afetivos considerados positivos ajudam na modelação futura do sistema nervoso.

Por isso, para mais novos e mais velhos, esta é uma época que deixará marcas. Resta-nos agora saber que, felizmente, já há esperança ao fundo do túnel. A vacinação começou, sabemos mais sobre a doença, é inevitável que o correr do tempo joga mesmo a nosso favor, na possibilidade do restabelecimento das ligações e dos contactos físicos que, entretanto, todos vimos interrompidos.

Até lá, aconselho a todos que mantenham contactos, nem que seja à distância, por telemóvel ou redes sociais. Sejam criativos e, mais que tudo, não esmoreçam! Para que avós e netos possam continuar a sentir presentes a força dos laços que sempre os uniu e que, em breve, serão retomados da maneira que todos precisamos.

 

Pedro Strecht, Médico Pedopsiquiatra

Fevereiro de 2021

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